A crise sanitária e econômica, que a pandemia da covid-19 obrigou o nosso País a enfrentar, suscita a prioridade absoluta de uma mudança profunda no saneamento básico. Os números que refletem o tamanho do problema já são conhecidos: até hoje, cerca de 100 milhões de brasileiros não contam com serviços de esgotamento sanitário; e 30 milhões não têm acesso à água potável.
Recentemente, a Frente Parlamentar Mista de Logística e Infraestrutura (Frenlogi), realizou seminário virtual sobre o tem, com foco no projeto de lei, já aprovado na Câmara dos Deputados e agora sob análise do Senado Federal, que visa criar um marco de segurança jurídica, capaz de atrair investimentos suficientes para a universalização desses serviços até 2037.
O evento contou com a participação do relator da matéria, senador Tasso Jereissati (PSDB/CE); do presidente da Confederação Nacional de Municípios, Glademir Aroldi; e de representantes do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); do Instituto de Engenharia; e da Abcon, entidade que congrega as empresas privadas do setor.
O debate alentou minhas esperanças de que esse gigantesco desafio poderá, sim, ser vencido no horizonte de tempo desta geração. Um dos grandes méritos do projeto é que ele está longe do diema privatização versus estatização.
É verdade que, de modo geral, a predominância do Estado na execução desses serviços têm deixado muito a desejar, e os dados do déficit de cobertura que acabo de referir comprovam isso. Mas, também há casos vitoriosos de órgãos públicos de saneamento que fazem um bom trabalho, a exemplo do meu município natal de Rondonópolis. Ali, graças à continuidade de esforços entre sucessivas administrações, estamos bem perto da universalização.
O marco delineado pelo projeto de lei é flexível, assegurando espaço à participação de empresas públicas e capitais privados, sob formatos diversos, como concessões e parcerias público-privadas (as chamadas PPPs). O que importa é atingir dois grandes objetivos: melhorar a qualidade de vida da população e acelerar a retomada do crescimento econômico e dos empregos, no período de pós-pandemia.
De acordo com estudos das Nações Unidas, para cada 1 dólar investido em saneamento básico, mais de 4 dólares são economizados em assistência à saúde. E, para cada bilhão de reais de investimentos no setor, são criados cerca de 60 mil empregos!
Até o final deste ano, em razão dos gastos públicos emergenciais para combate ao novo coronavírus, a dívida pública poderá chegar a 100% do PIB. Já bem antes da pandemia, dada a precária situação financeira da União e de grande parte dos estados e municípios, o investimento público em saneamento se mostrava insuficiente para acompanhar o aumento da população.
De outra parte, a magnitude desse desafio no Brasil fomenta o interesse dos investidores nacionais e estrangeiros. O BNDES já conta com R$ 50 bilhões ‘em carteira’ para aplicar no setor, e oferece aos estados e municípios interessados em atrair parceiros privados a expertise técnica na elaboração de projetos viáveis e promissores.
Ou seja, só falta mesmo um conjunto de regras seguras para quem deseja investir e, também, para que os contratos cumpram a sua destinação social: qualidade dos serviços, manutenção adequada para eliminar desperdícios de água – que hoje chegam a 40% – e respeito ao meio ambiente.
Para um país grande e infelizmente desigual, como este, o novo marco do saneamento deverá prever a correta distribuição tanto do ‘filé mignon’ quanto do ‘osso’ — isto é, blocos de concessões a serem licitados deverão incluir não somente municípios maiores e mais rentáveis, mas também cidades menores e de mais baixa renda. Outra boa notícia compartilhada pelo relator Jereissati é que o tamanho desse mercado,e o potencial de retorno sobre o capital investido, dispensarão o aumento das tarifas cobradas atualmente, e vão permitir a continuação das ‘tarifas sociais’ para os consumidores mais pobres.
Por tudo isso, a expectativa é que o Congresso Nacional aprove o projeto de lei e o encaminhe para a sanção do presidente da República com a rapidez que o Brasil merece e exige.
Wellington Fagundes é senador por Mato Grosso e presidente da Frente Parlamentar de Logística e Infraestrutura (Frenlogi)