61 ex-parlamentares que se envolveram com a máfia das ambulâncias – ou dos sanguessugas – são réus no Mato Grosso
Edson Sardinha e Eduardo Militão
Quatro anos depois de sacudir o Congresso e centenas de prefeituras, as denúncias da máfia das ambulâncias ainda provocam turbulência no Judiciário. Somente na Justiça Federal de Mato Grosso, estado de origem das empresas envolvidas no esquema, tramitam 234 processos criminais relacionados à Operação Sanguessuga. Entre os réus, estão 61 ex-parlamentares de 22 estados brasileiros, identificados no levantamento feito pelo Congresso em Foco. Desses, oito são da legislatura 1999/2003, que antecedeu à do escândalo que resultou no pedido de cassação de 72 deputados e senadores em 2006. 27 dos processados são candidatos nestas eleições.
Todos os processos criminais da máfia das ambulâncias que tramitam na 2ª Vara da JFMT estão nas mãos do juiz Jeferson Schneider. As denúncias são pelos crimes de formação de quadrilha ou bando, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e contra a Lei de Licitações. O juiz condenou 22 pessoas e inocentou nove até agora. Outros 23 processos estão prontos para sentença, informa a assessoria do juiz.
Entre os condenados, há um ex-deputado: Cleuber Carneiro (PTB-MG). Em maio deste ano, o petebista mineiro se tornou o primeiro ex-parlamentar punido criminalmente por envolvimento com o esquema dos sanguessugas no país. As três condenações anteriores de ex-congressistas, registradas em outros estados, se referiam a ações cíveis por improbidade administrativa.
Cleuber foi condenado a dois anos de reclusão e multa por corrupção passiva. Ele foi absolvido da acusação de formação de quadrilha. A reclusão foi substituída por pena de prestação de serviços e multa de valor não informado. O advogado do ex-deputado entrou com recurso no final de julho, contestando a decisão, para que o caso seja analisado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília. “Parte da denúncia já caiu na sentença. A segunda cairá no tribunal. Como ele tem mais de 70 anos, a pena fatalmente será atingida pela prescrição”, disse Marcelo ao Congresso em Foco.
O ex-deputado foi acusado pelo empresário Luiz Antônio Vedoin, sócio da Planam e apontado como chefe da quadrilha dos sanguessugas, de receber R$ 60 mil em propina e de direcionar licitações em prefeituras para favorecer empresas da máfia das ambulâncias. O empresário apresentou à CPI que investigou o caso comprovante de um depósito de R$ 14,4 mil em nome de Cleuber e disse que entregou outros R$ 42 mil pessoalmente a ele. “Ao longo das investigações, o Banco do Brasil informou que não era possível comprovar quem era o depositante desse valor”, afirmou o advogado do ex-deputado.
Segundo Marcelo Leonardo, as provas levantadas pela acusação contra seu cliente são inconsistentes. “O deputado não fazia política nos municípios citados pelo Vedoin, nem fez emendas para essas cidades”, declarou o defensor de Cleuber Carneiro.
Demais processados
Entre os processados pela JFMT, está o ex-deputado Cabo Júlio (PMDB), vereador em Belo Horizonte e candidato a deputado estadual em Minas Gerais nestas eleições. Em agosto do ano passado, Cabo Júlio foi condenado por improbidade administrativa pela 7ª Vara da Justiça Federal a devolver R$ 143 mil aos cofres públicos e a pagar multa de três vezes o valor embolsado do erário público por causa de envolvimento com a máfia dos sanguessugas. O ex-deputado recorre da decisão, que determinou, ainda, a suspensão de seus direitos políticos por dez anos.
Segundo a sentença, ele direcionava emendas e processos licitatórios para favorecer empresas da família Vedoin, em troca de comissões. Em abril deste ano, o vereador publicou em seu blog uma carta de desabafo em que reconhecia a culpa. “A máfia das ambulâncias foi um dos piores momentos da minha vida política. (…) Eu errei, eu permiti que a corrupção e o erro invadisse (sic) minha alma. Paguei e continuarei pagando um preço muito caro pelo meu erro imperdoável. Mesmo tendo 84 deputados investigados, fui o único a ser condenado em primeira instância. Apesar de recorrer, será que eu sou pior do que todos os outros 83? Eu colhi o que plantei”, declarou no blog. A assessoria do ex-deputado informou que não o localizou para retornar o contato da reportagem.
Este ano, outros dois ex-deputados foram condenados, em primeira instância, por improbidade administrativa. Em janeiro, a juíza substituta Paula Beck Bohn, da 2ª Vara Federal em Porto Alegre, condenou o ex-deputado Érico Ribeiro (PP-RS) por ter recebido recursos da família Vedoin. A sentença também proibia a participação do ex-parlamentar em processos de licitação, suspendia os direitos políticos dele por dez anos e exigia a devolução de R$ 10 mil aos cofres públicos e aplicava uma multa de R$ 30 mil.
Procurado pelo Congresso em Foco, Érico Ribeiro ressaltou que foi inocentado pela Justiça Federal de Mato Grosso e que está recorrendo da sentença da Justiça no Rio Grande do Sul. “No que se refere ao Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul, foi montado um processo contra mim a partir de notícias de jornais, e na certeza de que seria amplamente inocentado, pra surpresa geral, fui condenado. Meus advogados já entraram com recurso no Tribunal Regional Federal da 4ª região em Porto Alegre. Aguardo solução favorável por que realmente não sou responsável por nada do que estou sendo acusado”, afirmou em nota enviada ao site. Segundo ele, o caso dos sanguessugas “foi criado para esconder o escândalo do mensalão” no Congresso.
Ainda em março deste ano, a juíza Maria Cláudia de Garcia Paula Allemand, da 5ª Vara Cível Federal, do Espírito Santo, condenou o ex-deputado José Carlos Fonseca Júnior (DEM) a devolver R$ 189 mil aos cofres públicos por improbidade administrativa. Parlamentar da legislatura anterior (1999-2003), José Carlos foi acusado de enriquecimento ilícito por ter recebido recursos da Planam. Ele também foi proibido de assinar contrato com o poder público e teve os direitos políticos suspensos por dez anos.
O ex-deputado alegou, em sua defesa, que o dinheiro era para campanha eleitoral. Mas ainda cabe recurso contra a decisão. O capixaba também é réu num dos processos que tramitam na Justiça Federal de Mato Grosso. O Congresso em Foco encaminhou e-mail para o ex-deputado, que atualmente vive fora do país. Mas não houve retorno até o momento.
A condenação em primeira instância não impede nenhum político acusado de concorrer às eleições. A Lei da Ficha Limpa, cuja aplicação este ainda é alvo de controvérsia no Supremo Tribunal Federal (STF), prevê a inelegibilidade apenas em casos de condenação por órgão colegiado. Os casos que estão na 2ª Vara da Justiça Federal de Mato Grosso, no qual se concentrou o levantamento do site, são julgados por apenas um juiz.
Fonte:Congresso em foco