GERAL

Assédio eleitoral também é punido na esfera trabalhista, procuradora explica como evitar

O empregador que tenta influenciar o voto do empregado comete crime eleitoral e também pode ser responsabilizado na esfera trabalhista, com a possibilidade da condenação ao pagamento de indenização por danos morais coletivos e em obrigações de fazer e não fazer. O alerta é da procuradora do Ministério Público do Trabalho (MPT) Helena Duarte Romera, que concedeu em entrevista exclusiva ao Regional MT sobre esta e outras práticas que têm sido alvo de fiscalização pelo órgão (veja abaixo).

Na entrevista a procuradora fala também das reuniões com candidatos promovidas dentro das empresas. Ela explica que a prática não é recomendada e que os trabalhadores não podem ser obrigados a participar desses encontros.

A orientação vale para os empregados formalmente registrados, e também para terceirizados, aprendizes, estagiários e até para quem busca emprego nestas empresas.

Em relação aos trabalhadores a recomendação é para que os casos de assédio eleitoral sejam denunciados para que os órgãos competentes tomem as providências cabíveis. A denúncia pode ser feita pela internet e a identidade do denunciante é mantida sob sigilo.

CASOS
O Ministério Público do Trabalho é o órgão responsável por fiscalizar o cumprimento das leis e normas que regem as relações trabalhistas. Nas últimas semanas essa atuação ganhou destaque nacional após dois empresários serem enquadrados por crime de assédio eleitoral contra trabalhadores.

Os empresários chegaram a gravar vídeos orientando seus pares a assediar eleitoralmente os empregados. No primeiro caso, uma empresária da Bahia recomendava a demissão de servidores que manifestassem intenção de votar em candidatos da esquerda. No segundo, um pecuarista do estado de Tocantins oferecia vantagens para os trabalhadores que votassem pela reeleição do atual presidente. Além de sanções financeiras, eles tiveram de retirar os vídeos e responderão a processos.

Em Mato Grosso o MPT teve duas denúncias registradas. Uma, ocorrida em Confresa, ainda está sob investigação da PTM de Barra do Garças. A outra, ocorreu em Tangará da Serra, onde o dono de um hipermercado obrigava os trabalhadores a usarem uma camiseta com os dizeres ‘Deus, Pátria, Família e Liberdde’ – lema inspirado no fascismo italiano e que serve de mote na campanha pela reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL).

O caso de Tangará da Serra foi levado à Justiça Eleitoral e em decisão divulgada no último dia 20 de setembro o juiz da 19 Zona Eleitoral, Flavio Maldonado de Barros, determinou que o dono do hipermercado removesse as propagandas em favor de Bolsonaro e suspendesse a obrigação imposta aos funcionários sob pena de uso da força policial. Conforme o magistrado, a situação configurava crime eleitoral e também um desrespeito ao princípio da dignidade humana.

“Tudo começa e termina na dignidade da pessoa humana. Essa frase, emblemática, tem por trás e em torno todo o sistema de direitos fundamentais. Afinal, tais direitos surgem a partir da dignidade da pessoa humana, como proto princípio que é, existem para protege-lo e promove-lo”, disse o magistrado.

Na entrevista concedida ao RegionalMT, a procuradora Helena Duarte Romera, compartilha esse entendimento. Para ela, o assédio eleitoral viola "a liberdade de consciência, a liberdade de expressão e de orientação política do trabalhador”.

 

Veja a seguir a íntegra da entrevista:

Regional MT- Muitas empresas abrem espaço para que os candidatos conversem com seus funcionários no ambiente de trabalho. Essa prática é permitida? Caso positivo, quais as condições?
R. O ideal é que o ambiente de trabalho seja um ambiente neutro do ponto de vista da demonstração política. Partindo do pressuposto de que a nossa Constituição Federal prevê a liberdade de consciência, a liberdade de expressão e de orientação política e inclusive protege o livre exercício da cidadania, é certo que o trabalhador tem toda a liberdade de definir o seu voto de acordo com as suas opiniões e valores pessoais. É inclusive para assegurar a liberdade de escolha no processo eleitoral por parte de todas as pessoas cidadãs que o voto no Brasil é direto e secreto. Sendo assim, se a empresa faz campanha para determinado candidato no local de trabalho ou até mesmo pede para que o trabalhador apoie determinado candidato ou partido, essa empresa está contrariando o direito do trabalhador à livre orientação política e está praticando um assédio eleitoral, mesmo porque no contexto da relação de trabalho é muito fácil que o trabalhador se sinta coagido a, sendo vítima de tais práticas, votar no candidato de preferência do empregador para manter o seu emprego, o que demonstra a configuração do assédio eleitoral laboral.

Assim, recomenda-se que as empresas não realizem nenhum tipo de evento de cunho político, muito menos que obriguem os trabalhadores a participarem – pois configura conduta discriminatória e assédio eleitoral. Se tal evento ocorrer, deve no mínimo ser totalmente dissociado do ambiente de trabalho e do contexto de trabalho.

Regional MT- Caso o trabalhador se sinta constrangido ou coagido a informar ou mudar o seu voto sob pena de demissão, como deve proceder?
R: A prática de constranger ou coagir trabalhador a informar ou mudar o seu voto sob pena de demissão é irregular, pois viola a liberdade de consciência, a liberdade de expressão e de orientação política do trabalhador, configurando assédio eleitoral laboral. Em casos assim, recomendamos que os trabalhadores procurem o Ministério Público do Trabalho (MPT) para realizar uma denúncia. A denúncia pode ser feita de forma anônima pelo site www.mpt.mp.br e, aqui no estado do Mato Grosso, também pelo telefone Tel: (65) 3613-9100 ou presencialmente nas unidades do Ministério Público do Trabalho. É necessário que a denúncia informe os dados da empresa denunciada e relate em detalhes a situação irregular, também sendo muito importante que o denunciante forneça os seus dados de contato (que permanecerão sob sigilo), pois pode ser necessária a solicitação de informações complementares para a deflagração da investigação.

Regional MT- O que pode acontecer com empresas/empresários que adotarem essa prática (coação eleitoral) contra os trabalhadores?
R: Os empresários que praticam coação eleitoral ou qualquer ato que configure assédio eleitoral cometem crime eleitoral, conforme artigos 299 e 301 do Código Eleitoral, e, além disso, serão responsabilizados na esfera trabalhista, com a possibilidade da condenação ao pagamento de indenização por danos morais coletivos e em obrigações de fazer e não fazer, para que não haja a repetição da prática irregular.

Regional MT – Que outras orientações o MPT tem para os empregadores neste período eleitoral?
R -Nesse momento da proximidade das eleições, o MPT recomenda que as empresas e empregadores em geral se abstenham de conceder ou de realizar qualquer promessa de concessão de benefício ou vantagem a pessoas que buscam trabalho ou possuem relação de trabalho com sua organização (empregados, terceirizados, estagiários, aprendizes, entre outros) em troca do voto de tais pessoas em candidatos ou candidatas nas próximas eleições e que não ameacem, não constranjam, não orientem pessoas que possuem relação de trabalho com sua organização ou mesmo aquelas que buscam trabalho a votar em candidatos ou candidatas nas próximas eleições.

 

 

Eduardo Ramos – Da Redação

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