Políticas públicas para cidades inteligentes

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É preocupante constatar que o recente estudo Cities in Motion Index (Cimi) – 2019, da Escola de Negócios da Universidade de Navarra, na Espanha, tenha apontado que os municípios brasileiros estejam muito distantes do conceito de cidades inteligentes. De acordo com o levantamento, Rio de Janeiro, a mais bem colocada de nosso país, está em 128º lugar, atrás das vizinhas Santiago, no Chile (66º), Buenos Aires, na Argentina (77º), e Montevidéu, no Uruguai (92º). Londres é a líder mundial.

Cabe refletir por que o Brasil encontra dificuldades de se enquadrar nesse parâmetro contemporâneo de urbanismo. Fica claro que precisamos rever numerosas questões internas e políticas públicas, pois o marco de cidade inteligente não é mera grife e tampouco se caracteriza por meras iniciativas tecnológicas isoladas. Trata-se de uma referência de qualidade da vida, bem-estar e desenvolvimento. Para evoluirmos nesse conceito, precisamos contemplar o planejamento urbano e a gestão dos municípios, de modo que atendam, de modo integrado, a requisitos básicos de saúde, educação, transporte, meio ambiente, habitação e segurança. Pouco ajuda estarmos, de um lado, entre as nações com o maior número de startups e, de outro, batermos recordes de homicídios.

Além das dificuldades de gestão e zeladoria municipais, para que haja cidades inteligentes no Brasil é necessário solucionar aspectos fundamentais para seu advento. Como podemos, por exemplo, criar polos tecnológicos, se demoramos quase uma década para aprovar e licenciar novos projetos de desenvolvimento urbano? Como melhorar a mobilidade urbana, se, depois de 20 anos em obras, o rodoanel em São Paulo ainda não foi finalizado. Inteligência e burocracia são palavras antônimas.

Cidades são espaços de problemas, desafios e oportunidades e abrigam a maioria da população mundial. Além disso, são altamente poluidoras e geradoras de conflitos de desigualdade e exclusão social. As previsões indicam que as 600 maiores do mundo gerarão 60% do PIB global em 2025 (Mackinsey/2011). Assim, imperativos demográficos, econômicos, sociais e ambientais tornam premente a aposta em novos modelos de desenvolvimento urbano.

Infelizmente, nos últimos 20 anos, as políticas públicas brasileiras com foco no desenvolvimento urbano não têm contribuído para a criação de modelos de cidades inteligentes, nas quais as liberdades econômica, criativa e empreendedora devem ser priorizadas e incentivadas. Na contramão dessas tendências, criou-se no País um intrincado arcabouço legal, com milhares de normas (só na área ambiental, são mais de 22 mil). Tal emaranhado burocrático-normativo, um pesadelo para quem quer investir, conspira contra o nascimento e a favor da morte de empresas.

Assim, o Brasil vai se distanciando de várias nações onde a liberdade econômica é estimulada. De acordo com o relatório Doing Business 2019, do Banco Mundial, ocupamos a 109ª posição em ambiente de negócios, dentre 190 países. No âmbito dos Brics, somos lanternas. É triste constatar que, na realidade, estamos ficando no final da fila em praticamente tudo.

Pensamos como primeiro mundo. Somos produtores incansáveis de legislação de país desenvolvido, mas, na verdade, somos uma nação subdesenvolvida, com tudo por fazer. Precisamos de investimentos bilionários para subir um pouco nos rankings globais de competitividade. Só para exemplificar, para universalizar os serviços de saneamento básico, são necessários mais de 300 bilhões de reais.

Se não temos recursos para investir, devido à crise fiscal e ao baixo desempenho econômico, é premente uma postura em favor do desenvolvimento, com mais agilidade nas aprovações de empreendimentos, menos obstáculos ao ingresso de capital e soma de forças entre os setores público e privado. Será muito difícil agregar inteligência às cidades, como vem ocorrendo em numerosas nações, quando questões relacionadas ao populismo e/ou à ideologia interferem no planejamento e nas aprovações de projetos urbanísticos adequados, ao mesmo tempo em que respaldam a tolerância com práticas de uso e ocupação do solo conflitantes com a sustentabilidade.