O que fazer com os papagaios do fascismo neoliberal?

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Frequentemente me deparo na internet e também no mundo real com um tipo de gente que professa valores contraditórios e perigosos. A maioria tem dificuldade para exprimir com palavras próprias o que defende, recorrendo à repetição sistemática de memes, mentiras divulgadas nas mídias tradicionais e digitais (as fakenews) ou preconceitos antigos apresentados com ‘nova’ roupagem. Já vi vários termos usados para definir essas pessoas, mas decidi formular um que me parece mais completo: são os papagaios do fascismo neoliberal.

No mundo animal os papagaios têm a capacidade de falar e conseguem reproduzir quase todo tipo de som. Mas eles apenas repetem, não têm a capacidade de criar linguagem ou raciocinar sobre o que dizem. O mesmo se dá com essa anticategoria social que criamos no Brasil.

Os papagaios do fascismo neoliberal são, em geral, pessoas da classe média que se acham ou sonham fazer parte de uma elite econômica por eles idealizada. Mas, estranhamente, há também trabalhadores, gente pobre e integrantes de minorias historicamente excluídas. Estes atuam como fantoches, ignorando que o teatro macabro pode culminar com a imolação deles próprios (e de seus iguais, incluindo familiares).

Os nossos papagaios costumam repetir um mantra que ouviram de seus marionetistas, sem perceber que expressam valores incompatíveis. Enchem o peito ou abusam das maiúsculas para afirmar: Somos liberais na economia e conservadores nos costumes!

No fundo eles não sabem o que é ser liberal, desconhecem o significado de economia, confundem conservadorismo com atraso e propagam costumes que levamos séculos para superar – como o machismo, o racismo, a homofobia, a violência contra a mulher, o abuso de crianças e inválidos, a anticiência, a junção de Estado e igreja, o autoritarismo, a intolerância política e religiosa, a exclusão social… e por ai vai.

No que diz respeito aos costumes, nossos papagaios talvez nem se deem conta que defendem um retorno ao mundo das sombras. Como na fábula de Platão, sonham em nos colocar acorrentados numa caverna e vivendo sob aparências.

Querem de volta, por exemplo, aquela composição familiar do século passado e anteriores – quando o adultério masculino era louvado e o pai tinha direito de vida e morte sobre esposa e filhos. Querem liberdade para abusar de suas crianças, agredir quem tem costumes diferentes e, se for o caso, espancar até a morte suas companheiras e filhos quando achar conveniente.

Na economia, máxima contradição. Defendem um estado policialesco, gigante para interferir nas questões políticas (fiscalizar, impedir e eliminar oponentes) e discricionário nos gastos – podendo torrar bilhões para comprar votos, distribuir cargos entre aliados e bancar mordomias muitas vezes ocultadas (orçamento secreto, cartões corporativos etc.). Mas querem também um ‘estado mínimo’, incapaz de cobrar impostos dos mais ricos e/ou fazer investimentos para emancipar os brasileiros mais frágeis com serviços e obras públicas eficientes.

Aqui cabe um pequeno comentário sobre o ‘ser liberal’. Considero o neoliberalismo uma das coisas mais horrendas já criadas pela ciência econômica, mas sua antítese capitalista, o Liberalismo, tem lá suas conquistas.

Não sou liberal, mas reconheço com admiração a contribuição deles em conquistas como o voto universal e secreto, o voto das mulheres, a busca pela igualdade civil, os direitos humanos, a separação de poderes institucionais, a ação estatal para superação de problemas socioeconômicos e a limitação da capacidade do Estado interferir na vida dos cidadãos.

É por isso que ao invés de simplesmente ignorar ou reagir agressivamente aos nossos papagaios, prefiro sugerir que eles saibam mais sobre o assunto. Que ao invés de se satisfazerem com memes e lacrações, tentem conhecer algo sobre figuras como Adam Smith, Voltaire ou John Stuart Mill. Os que fazem isso costumam adquirir a capacidade de raciocinar e, ato contínuo, libertam-se da condição de meros papagaios. Tornam-se seres críticos, capazes de perceber que o mundo fora das sombras é mais colorido, bonito e pode ser melhor do que jamais foi.

Na medida em que usarmos o conhecimento para iluminar o ambiente, o número desses papagaios será reduzido e teremos condições de combater com mais vigor os ‘fascistas neoliberais’ por trás deles. Sim, estou falando daquele 1% que manipula mais da metade da economia mundial e lucra com a multiplicação do ódio e da miséria. Mas isso é tema para outra conversa.

Primeiro, acendamos as luzes!