O Poder Judiciário e o empoderamento do povo

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Como é sabido, o Poder Judiciário tem seus princípios e atribuições determinados pela Constituição Federal, que é o documento que fundamenta todo o ordenamento jurídico do Brasil, desde 1824.

No Brasil, a Constituição de 1824, em seu Título VI, o denominou de Poder Judicial. Por sua vez, na Constituição de 1891 o Judiciário recebeu uma roupagem nova com a instituição de um órgão máximo, denominado Supremo Tribunal Federal.

Contudo, foi com a Constituição Federal da República de 19881 que o Poder Judiciário ganhou vários dispositivos legais o regulamentando, sendo possível afirmar que tal constituinte se dedicou à estruturação de um Judiciário com absoluta autonomia institucional para se reger de forma administrativa e financeira.

Assim, tendo a República Federativa do Brasil adotado a clássica teoria de tripartição de funções do Estado, organizada por Montesquieu, o artigo 2º da Constituição Federal de 1988 define o funcionamento de três poderes: o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Nos artigos 92 a 126 do Capítulo III da Constituição Federal de 19882, vislumbramos a atual configuração estrutural do Poder Judiciário brasileiro disciplinando o conjunto de competências e atribuições exercidas por seus órgãos, suas funções típicas e atípicas, sua organização e autonomia administrativa e financeira, destacando-se sua típica atribuição de dirimir as lides que lhe são apresentadas, promovendo pacificação social e interpretação das leis.

Desta forma, o Poder Judiciário tem como função principal defender os direitos de cada cidadão, promovendo a justiça e resolvendo os prováveis conflitos que possam surgir na sociedade, através da investigação, apuração, julgamento e punição.

Ocorre que o Poder Judiciário, no modelo atual, atravessa momentos difíceis, cuja realidade se externa em sistemas eletrônicos falíveis e/ou gabinetes abarrotados de processos, culminando em andamentos morosos, enquanto que a sociedade contemporânea, como em outros setores, busca por respostas rápidas. Isso porque o mundo atual enfrenta inúmeros problemas cada vez mais urgentes, dentre tantos, as questões ambientais globais e os conflitos regionais, a pobreza e a desigualdade social.

A sociedade cresceu e, em tese, evoluiu, com a globalização e as novas tecnologias; nesse contexto, a perspectiva é de que as pessoas tenham a oportunidade de escolher novas portas para a resolução dos seus conflitos, de forma que não só ao poder judiciário seja concedido o gozo da resolução dos conflitos de forma pacífica. Conclama-se, então, o poder/dever de cada indivíduo resolver de forma pacifica seus conflitos, comprometido com a cultura do diálogo e da paz, objetivando uma solução não combatente e humanizada.

Nessa ordem de ideias, o Poder judiciário, por meio de Política Judiciaria Nacional, criou estruturas como a Resolução CNJ 125/2010, a qual “está estruturada na forma de um tripé: no ápice está o CNJ, com algumas atribuições de caráter geral e nacional; abaixo dele estão os Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMECs) de cada tribunal, responsáveis pelo desenvolvimento da Política Pública nos Estados e pela instalação e fiscalização dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs); os CEJUSCs são as “células” de funcionamento da Política Pública, nas quais atuam os grandes responsáveis pelo seu sucesso, suas “peças-chave”, que são os conciliadores, mediadores e demais facilitadores de solução de conflitos, bem como os servidores do Judiciário, aos quais cabe a triagem dos casos e a prestação de informação e orientação aos jurisdicionados para garantia do legítimo direito ao acesso à ordem jurídica justa3.

Vale ressaltar que a política nacional de resolução pacífica de conflitos, teve como marcos normativos a Resolução nº 125/10, do Conselho Nacional de Justiça, o Código de Processo Civil4, e a Lei de Mediação, Lei nº 13.140/15, as quais visam uma sociedade pacifica e inclusiva para o desenvolvimento sustentável, seus fundamentos justificam a ampliação do acesso à justiça e a paz social, por meio de ferramentas de pacificação para cada área específica.

A propósito, recentemente, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) se reuniu com autoridades estrangeiras, a cúpula do Poder Judiciário brasileiro e especialistas de universidades como USP e Fundação Getúlio Vargas (FGV) na I Conferência Internacional de Prevenção e Solução de Conflitos. Debatendo o tema “Escolas, entes públicos e sociedade em convergências pela paz.5

Nessa toada, a mediação e a conciliação conferem acesso à Justiça eficiente, tendo em vista solucionar o conflito de forma mais dinâmica, procurando a máxima efetividade dos direitos, além de empoderar os envolvidos na responsabilidade pela tomada e execução da solução.

Justamente, é por tal motivo que se faz mister que as pessoas aprendam mais do que nunca a usar o seu poder de forma positiva para superar as adversidades existentes, e, para tanto, é fundamental que se utilizem do diálogo e dos métodos adequados e pacíficos de resolução de conflitos para superarem as lides delas decorrentes.

As ferramentas são inúmeras, mas por vezes o óbvio nos escapa. Assim, podemos elencar a fala de forma sincera e aberta, a escuta das perspectivas de cada um e o esforço para entender os pontos de vista diferentes; também não se dispensa a aceitação das diferenças existentes entre cada ser criativo, etc. Valendo-se destes, entre outros instrumentos, as pessoas exercem poder, podem de escolher um caminho mais suave, se permitem à possibilidade de reconciliação, de focar na solução pacifica das questões.

Não se desconhece que, em consideráveis vezes, as partes envolvidas em um conflito não aceitam estarem totalmente erradas, e por isso é compreensível pensar em uma resolução que

seja adequada para todos, sem que as coisas se transformem em uma disputa de ego, e o caminho ideal é uma forma de mostrar o poder de resolução dos conflitos de forma pacifica.

Outrossim, são várias as portas que estão sendo abertas e aperfeiçoadas com intuito de levar à população os conhecimentos dos meios adequados de resolução de conflitos, cujo objetivo maior é capacitá-la para prevenir conflitos ou então resolve-los de forma pacífica. A meta central é estimular a mediação de conflitos fora das instâncias judiciais – hoje altamente demandadas -, propondo às pessoas um caminho mais ágil, eficiente e extrajudicial, por meios dos métodos adequados, como a mediação, conciliação e arbitragem.

Apresentando-os, a Mediação é conceituada como sendo a conduta pela qual um terceiro aproxima as partes conflituosas, auxiliando-as e facilitando a composição, que há de ser decidida pelas próprias partes, ponderando a multidimensionalidade e complexidade dos conflitos.

Já a Conciliação, é um método utilizado em questões mais simples, ou restritas, no qual o terceiro facilitador pode adotar uma posição mais ativa, porém neutra e imparcial com relação ao conflito. É um processo consensual breve, que busca uma efetiva harmonização social e a restauração, dentro dos limites possíveis, da relação social das partes6.

As duas técnicas são norteadas por princípios como informalidade, simplicidade, economia processual, celeridade, oralidade e flexibilidade processual, conforme diretriz da Resolução nº 125/2010, do CNJ, além da confidencialidade, decisão informada, competência, imparcialidade, independência e autonomia, respeito à ordem pública e às leis vigentes, empoderamento e validação.

A Arbitragem também é um método alternativo de solução pacifica de conflitos, só que através de um terceiro individuo denominado árbitro, normalmente um especialista na matéria controvertida. O procedimento é disposto na lei 9.307/96, com a finalidade de solucionar conflitos das mais variadas áreas, desde que envolva direitos disponíveis e que o objeto em conflito seja negociável. A sentença dada pelo árbitro, que pode ser fundamentada no direito ou na equidade, possui a mesma validade de um de uma sentença judicial, nos termos do disposto no art. 515, inc. VII, do Código de Processo Civil.

Mesmo diante de tantos métodos disponíveis, não se olvida que o conflito é inerente a vida de todo ser e, de certa forma, é importante na vida das pessoas. Contudo saber resolvê-los de forma menos combativa, que não afete a rotina pessoal e profissional dos envolvidos e de terceiros, e sem exigir esforço heroico de cada um dos envolvidos, é imprescindível que haja o empoderamento humano das partes, para que possam se utilizar, de modo ponderado, ou ao menos humanizado, do livre arbítrio, e então escolherem o que é justo de forma inteligente.

Desta forma, são várias as formas de resolução pacifica dos conflitos, sendo as mais usuais a mediação, a conciliação, a negociação e a arbitragem, todas divulgadas e colocadas à disposição da sociedade, em rede constituída por todos os órgãos do poder judiciário e por entidade públicas e privadas, visando a pacificação social e o empoderamento do povo, permitindo o acesso a uma justiça célere, justa, econômica, sigilosa e pacificadora, deixando para o poder judiciário as questões mais complexas, incompatíveis com a autocomposição.

*Erenita Costa Soares