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sábado, novembro 23, 2024

Mãe de UTI: a história de amor de uma mato-grossense na luta pela vida de seu bebê prematuro extremo

A experiência de ter um bebê é sempre um momento singular. Para algumas mulheres, contudo, ganha alguns predicados a mais. Elas não puderam levar seus bebês prematuros para casa e tiveram que aprender, por um tempo, a serem mães dentro da maternidade. Lidar com uma realidade bem diferente daquela que foi idealizada é um aprendizado difícil para aquelas que tiveram bebês que saíram da sala de parto direto para uma incubadora na UTI Neonatal.

Guerreiros. Essa seria a definição perfeita para a engenheira de alimentos tangaraense Ramayana Rodrigues, de 27 anos, e o pequeno Miguel, de 11 meses. Após semanas de gestação recheadas de expectativa, ansiedade e devaneios ao imaginar como seria a carinha do bebê, o primeiro dia em casa, os afagos na hora de dormir e idealizando como seria a vida com aquele novo ser, Ramayana levou um susto: sua bolsa estourou naturalmente com cerca de 17 semanas de gestação.

Em instantes, o instinto maternal nutrido por meses foi substituído por uma intensa luta por sobrevivência da mãe e do filho. As conversas sobre mamadeiras e cremes para assadura deram lugar a explicações complicadas de procedimentos médicos e a busca por um final feliz.

"Foi com 19 semanas que este quadro de bolsa rota se confirmou por meio de exames. Para muitos médicos, minha gravidez era considerada inviável. Alguns recomendaram a interrupção da mesma, pois o risco de infecções que poderiam me levar a óbito eram muito altos. Nosso estado era crítico. Orei muito e pesquisei na internet até descobrir que existiam chances para nós. Quando soube de um caso similar no Hospital Santa Rosa, na Capital, fiz as malas em Barra do Bugres, onde moro, e vim correndo", relembra.

A desejada maternidade deixou de ser vivenciada a dois para se tornar uma experiência assistida por médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, fonoaudiólogos e uma enorme equipe hospitalar trabalhando 24 horas no caso.

"Manter uma gestação tendo um bebê sem líquido amniótico foi o principal desafio. Isto, porque ele tem um papel importante para a formação e amadurecimento do pulmão – que é como uma esponja que precisa do líquido para crescer e que quando o bebê nasce, seca. Quando rompeu a bolsa, ela não estava grávida nem de cinco meses", explica a pediatra neonatologista Paula Gattass Bumlai, gestora médica da UTI Neonatal do Hospital Santa Rosa.

MATERNIDADE ASSISTIDA – As marcas dessa história estão visíveis na voz e nos olhos marejados de Ramayana, bem como no de todas as mulheres que, certa vez, moraram dentro de uma unidade intensiva com um recém-nascido. Todas elas sabem a data exata da internação, da alta e exatamente a quantidade de dias que foi preciso para a recuperação de seu bebê. Da mesma forma, sem hesitar, listam em ordem cronológica todos os procedimentos realizados nesse percurso. Durante esse período, não sabem dizer o que aconteceu fora daquele universo, pois enquanto o tratamento dura, o mundo de sondas, tubos e máquinas apitando resumem a vida dessas mulheres.

Para Ramayana foram sete semanas prévias de internação, dois dias e meio em trabalho de parto, entre eternos 50 minutos dentro do centro cirúrgico, mais 73 dias de UTI Neonatal. O pequeno Miguel nasceu com 27 semanas, 35 centímetros e 1.070 gramas quando o normal seriam 40 semanas, 50 centímetros e 2.500 gramas. Por isso, saiu da barriga da mãe, há 11 meses, direto para a mão da médica pediatra neonatologista.

Dentro da UTI Neonatal, Ramayana recorda os melhores e os piores dias de sua vida. Foi lá onde ela viu, com tranquilidade, mesmo que dentro de uma incubadora, o seu tão esperado filho. Foi neste mesmo local que ela tocou nele pela primeira vez, apesar de estar preso a respiradores mecânicos e equipamentos que limitavam a movimentação e, também, ali, na UTI, foi onde ela o abraçou em seu colo e o amamentou no peito pela primeira vez.

"Entrar em uma UTI foi muito impactante. Fiquei assustada. Nunca vou me esquecer do cheiro de álcool – de um ambiente estéril – e do apito das máquinas. Até hoje me pego escutando. Mas, ao mesmo tempo, me passava confiança e esperança. Passei a viver uma vida na UTI como se estivesse em casa. Inclusive, ordenhando o leite a cada três horas, acordando até de madrugada, como se ele estivesse comigo. Tocando nele, a princípio, apenas com as pontas dos dedos, por uma hora, durante as visitas. Ele é meu 'milagrinho'. Por ele, reorganizei minha rotina em uma nova cidade e a cada dia que passava era uma batalha vencida", comenta a engenheira de alimentos.

DIA DAS MÃES – Este domingo (14.05) terá um significado especial para a Ramayana Rodrigues: será o primeiro “Dia das Mães” com o filho Miguel. A data, para ela, é sinônimo de conquista.

"Passa um filme na cabeça. Estou muito emotiva. No ano passado, nesta mesma data, estava internada lutando por nós dois. Depois de tudo que passei, demora para cair a ficha que vou passar meu primeiro "Dia das Mães" com ele. É maravilhoso. Somos guerreiros. Me sinto mais do que mãe. Ele é uma benção. Hoje, Miguel é bem danado e curioso. Já engatinha e bate palmas. Superou todas as expectativas", descreve Ramayana, com orgulho.

PREMATURIDADE – A vitória de Miguel representa uma evolução importante no cuidado com prematuros em todo o mundo. Na década de 1990, apenas 60% dos bebês nascidos antes de completar 37 semanas de gestação conseguiam sobreviver. Hoje, esse número já alcança 95%, segundo a pesquisa Born Too Soon da Organização Mundial da Saúde (OMS) com base em dados de 184 países.

Entre os prematuros extremos — nascidos entre 23 e 28 semanas de gestação, como Miguel—, a situação é ainda mais delicada: 90% deles morrem nos primeiros 10 dias de vida. "Os cuidados com prematuros evoluíram muito. Ainda assim, abaixo de 30 semanas, a chance de mortalidade e de sequelas ainda é alta. Casos como o do Miguel são isolados", ressalta a gestora médica da UTI Neonatal do Hospital Santa Rosa, Paula Gattass Bumlai.

A médica destaca que o nascimento de um prematuro extremo requer um sistema complexo de cuidados. Devido à imaturidade de seus órgãos, essas crianças são muito mais suscetíveis a doenças cardíacas, neurológicas e pulmonares. "Miguel, por exemplo, precisou usar oxigênio, ter o acompanhamento de um fonoaudiólogo para aprender a mamar, fazer uso de medicamentos para o amadurecimento do pulmão, entre tantos outros cuidados", conta.

O Brasil é o décimo país onde nascem mais prematuros no mundo. Ou seja, a cada 100 crianças, cerca de 11 são prematuras – isto é, nasceram antes de completar 37 semanas. Dados apresentados no relatório "Prematuridade e suas Possíveis Causas", apoiado pela Unicef, mostram que a prevalência de partos de crianças prematuras é de 11,7% em relação a todos os partos realizados no país.

"Quanto maior ou menor a idade da mãe, os extremos de idade materno, maiores as chances de prematuridade. Gestações gemelares também apresentam uma pré-disposição. Infecções durante a gravidez, problemas ginecológicos, alterações no organismo são outros fatores. Mas, a maioria pode ser prevenido com acompanhamento médico. Por isso, a importância em fazer um pré-natal desde cedo, estar bem informado e com as vacinas em dia – seguindo sempre as recomendações médicas. Escolher antecipadamente um pediatra neonatologista para estar presente na hora do parto é uma segurança a mais que as grávidas também podem ter", pontua Bumlai.

ALTA HOSPITALAR – Após o nascimento, os bebês prematuros passam a ser monitorados a partir do que os médicos denominam de "idade corrigida" – Miguel, por exemplo, deveria ter nascido somente três meses depois. Hoje, estaria com cerca de oito meses de acordo com a idade corrigida, ainda que tenha 11 meses. Este termo é usado para interpretar o amadurecimento neurológico do bebê e estimar parâmetros de desenvolvimento da criança.

"Após a alta hospitalar, uma vez por mês, durante um ano, os bebês também passam por consultas de puericultura. Isto, para o acompanhamento do crescimento, desenvolvimento, bem como para orientação e aplicação de vacinação especial, entre outros", informa a pediatra neonatologista.

UTI NEONATAL – Prestes a completar 20 anos, o Hospital Santa Rosa apresenta uma UTI Neonatal de alta complexidade composta por 10 leitos completos neonatais, incubadoras de última geração, respiradores/ventiladores mecânicos da mais alta tecnologia – capazes de atender bebês de até 300 gramas –, equipamentos de LED de alta potência para o tratamento de icterícia, e serviços de exames à beira leito.

Uma equipe multidisciplinar atua 24 horas na UTI Neonatal, sendo composta por médicos pediatras neonatologistas, enfermeiros, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, farmacêuticos, nutricionistas, entre outros profissionais. Também apresenta em seu quadro uma equipe de cardiologia e de cirurgia infantil à disposição. Pioneiro na região Centro-Oeste na conquista do selo da Acreditação Canadense, nível Diamond, a instituição também é certificada em Excelência, Nível III, pela Organização Nacional de Acreditação (ONA).

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