Lava Jato X Lei de abuso

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Sem demagogia e sem o filtro ideológico, que muitas das vezes pode macular a divulgação das informações, realizar uma análise jornalística a respeito desses fatos que envolvem a Operação Lava Jato, bem como a aprovação pelo Congresso Nacional da Lei do abuso de autoridade é de suma importância para afastar essa nuvem sombria – que tendem a esconder os verdadeiros interesses, seja políticos ou econômicos – do caminho de quem está no poder. Ou seja, o intuito maior desse artigo será trazer à tona os fatos dos bastidores para revelar a real face dessas forças “ocultas” que vêm movendo as peças no tabuleiro de xadrez da política brasileira.

Antes de se adentrar no mérito da questão, primeiramente, é pertinente revelar a origem das peças do jogo. Todo mundo sabe que, em decorrência da Operação Lava Jato, os bolsonaristas conseguiram chegar ao poder e hoje estão à frente do Executivo Nacional. Por outro lado, para se resguardar desse avanço operacional, congressistas da velha guarda da política, bem como aqueles que não desejam cair nessa malha fina das investigações, aprovaram a Lei do abuso de autoridade e assim remeteram o projeto para o presidente sancioná-lo ou não, o que será o estopim para uma carga explosiva, que pode acirrar ainda mais esse conflito político.

A Operação Lava Jato é um conjunto de investigações em andamento desencadeada pela Polícia Federal (PF), que cumpriu mais de mil mandados de busca e apreensão, de prisão temporária, de prisão preventiva e de condução coercitiva, visando apurar um esquema de lavagem de dinheiro que movimentou bilhões de reais em propina. A operação teve início em 17 de março de 2014 e já teve 61 fases operacionais autorizadas pelo então juiz Sérgio Moro, durante as quais prenderam-se e condenaram-se mais de cem pessoas.

Após esse breve resumo da operação, é preciso esclarecer que “nem tudo são flores no Brasil”. “Os fins justificam os meios” é uma frase atribuída a Maquiavel e que pode resumir em parte o desvirtuamento dessa operação policial. Popularmente, a frase é também usada como justificativa do emprego de expedientes desonestos ou violentos para a obtenção de determinado fim, supostamente legítimo. A frase significa que os governantes “devem” estar acima da ética dominante para manter ou aumentar seu poder.

Porém, afirmar que o atual ministro da Justiça Sérgio Moro chegou ao cargo por conta desses meios escusos seria uma acusação séria, que a oposição ao atual governo anda sustentando na mídia, sobretudo, após os inúmeros vazamentos de mensagens atribuídas ao chefe das operações, como as do procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Operação Lava-Jato em Curitiba, para o então, à época, juiz Moro.

Caso seja devidamente comprovado a veracidade do teor das conversas antirrepublicanas por parte dessas autoridades (juiz e procurador, que nunca poderiam trocar informações sobre melhoramentos de provas) revelaria uma monumental desobediência à ordem pública, sobretudo, ao princípio do devido processo legal constitucional, o que colocaria em xeque à própria legalidade de toda Operação. Mas quem vai atestar ou não essa versão será o Supremo Tribunal Federal (STF).

Por outro lado, como a Operação Lava Jato envolveu políticos dos maiores partidos do Brasil – incluindo presidentes da República, presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e governadores de estados, além de empresários de grandes empresas brasileiras – os congressistas, em resposta à essa avalanche de incriminações "indevidas, justas ou não", aprovaram a Lei de abuso de autoridade.

Desta forma, a Câmara dos Deputados aprovou na noite da última quarta-feira (14/8) o projeto de lei que atualiza a Lei do Abuso de Autoridade. A lei criminaliza abusos cometidos por servidores públicos, juízes, membros do Ministério Público e das Forças Armadas. A proposta lista 37 ações que, se forem praticadas com o intuito de prejudicar ou beneficiar alguém, configuram abuso de autoridade. Entre elas, obter provas por meios ilícitos; executar mandado de busca e apreensão de forma ostensiva para expor o investigado; impedir encontro reservado entre presos e seus advogados; e decretar a condução coercitiva de testemunhas ou de investigados que não tenham sido intimados a depor.

Entre as principais mudanças, além do trecho sobre conduções coercitivas, está a proibição de decretação de prisão provisória em "manifesta desconformidade com as hipóteses legais". O texto também prevê que a autoridade possa ser punida com seis a dois anos de prisão, além de multa, caso deixe de se identificar ou se identifique falsamente para o preso no ato de seu encarceramento.

Por sua vez, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou que ouvirá ministros antes de decidir sobre veto ao projeto de abuso de autoridade. Em nota à imprensa, a força-tarefa da Operação Lava Jato afirmou nesta última quinta-feira (15) que o projeto que define em quais situações será configurado o crime de abuso de autoridade é "um retrocesso no combate à corrupção".

Diante desses fatos, ninguém pode negar, em sã consciência, sem ser imbuído pelo viés ideológico, que a Operação Lava jato trouxe sim uma oxigenação para instituições públicas brasileiras, que outrora estavam infestadas pela corrupção generalidade dos governos anteriores, porém, não se pode fechar os olhos para os desvios ilícitos e interesses políticos que sobrevieram após a Operação Lava Jato.

Contudo, o que se fez dentro da legalidade do Estado Democrático de Direito deve ser mantido e até aprimorado, mas o que se fez à margem da lei, com intuito escuso da mera promoção pessoal e do enriquecimento ilícito, à custa da prisão ilegal de inocentes, deve ser rechaçado veementemente pelas autoridades brasileiras, sob pena de colocarmos os pilares democráticos da República a serviço de justiceiros e políticos mal-intencionados. "Dura lex, sed lex", ou seja, a lei é dura, porém é a lei.

Marcelo Ferraz é jornalista e escritor.