Indústria: saídas para a crise

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SÃO PAULO – Enquanto os presidentes do Brasil e da Argentina dão declarações extemporâneas, que vão de encontro a tudo aquilo que a diplomacia recomenda, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a União Industrial Argentina (UIA) distribuíram comunicado conjunto em que definem ações prioritárias para o segundo semestre deste 2021 com o objetivo de impulsionar o comércio bilateral e aprofundar a integração do Mercosul.

            Entre as propostas, estão sugestões para a facilitação de comércio e a cooperação regulatória entre os dois países, além de medidas para estimular a adoção de documentos eletrônicos para processos de comércio exterior. Também entre as preocupações comuns das duas entidades estão o aperfeiçoamento da Tarifa Externa Comum (TEC), bem como a intensificação de negociações extrarregionais, a internalização de acordos pendentes e a revisão de acordos do Mercosul.

            A busca desse entendimento, que, a princípio, deveria ter partido da alta cúpula dos governos dos dois países, nasce da constatação de que é preciso encontrar meios de superar a crise desencadeada pela pandemia de coronavírus (covid-19) que veio agravar os obstáculos históricos que resultam em perda de competitividade no mercado global. Parece que as duas entidades concluíram que, se as indústrias dos dois lados ficarem à espera de benefícios e iniciativas governamentais, o mais certo é que venha a ocorrer um processo ainda mais intenso de desindustrialização.

            Afinal, o crescimento dos dois países passa necessariamente pelo desenvolvimento produtivo, já que o comércio bilateral tem sido marcado por uma pauta composta por bens industrializados, que, infelizmente, a cada ano, está cada vez mais reduzida. Basta lembrar que, de 2011 até 2020, o comércio entre as duas nações caiu de US$ 40 bilhões para US$ 16 bilhões.

            Apesar das dificuldades causadas pela pandemia, para reverter essa tendência, é preciso aproveitar o momento de recuperação que a indústria brasileira tem mostrado nos últimos dias, como indica pesquisa da CNI. Segundo esse levantamento, entre março e abril, no auge da segunda onda de covid-19, na virada entre março e abril deste ano, a indústria reagiu de forma positiva, com a capacidade instalada mantendo-se acima de 80% pelo segundo mês consecutivo.

            Também as horas trabalhadas na produção cresceram 0,7% em abril, após alta de 1,1% no mês anterior, enquanto na comparação com abril de 2020 as horas aumentaram 35,1%. Já o emprego registrou alta pelo nono mês consecutivo e massa salarial retornou ao patamar pré-pandemia, segundo dados da pesquisa. No entanto, apesar da melhora na atividade, o faturamento real da indústria de transformação recuou 1,3% no período.

            É verdade que a comparação com o período anterior pode, nas atuais circunstâncias, não passar de enganação ou, para se usar um sinônimo mais elegante, sofisma, pois, efetivamente, não se pode falar em crescimento, mas apenas em retomada parcial do panorama que havia antes da pandemia. Afinal, a participação da indústria no Produto Interno Bruto (PIB) vem caindo sucessivamente nos últimos anos. Basta ver que, no primeiro trimestre, o crescimento do PIB foi puxado pelo setor agropecuário (quase 6%) e pela indústria extrativa (especialmente a de minério de ferro).

            É de se lembrar que a participação da indústria de transformação no PIB atingiu em 2020 o menor nível da série histórica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), iniciada em 1996: 11%. E que, neste ano, deverá ficar abaixo da agropecuária, que hoje já representa 11%, mas em fase de ascensão em função do atual ciclo de alta nas cotações internacionais de commodities, potencializadas pela elevação da taxa de câmbio. Por isso, vem em boa hora esse entendimento que CNI e UIA procuram em busca de saídas para a crise. Aliás, e sse entendimento deveria servir de exemplo para as autoridades governamentais dos dois países.