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sábado, novembro 23, 2024

Espaço Aberto com o jornalista Paulo Roberto de Mello

Neste mês foi comemorado o Dia do Jornalista, a data celebrada em 7 de abril é dedicada a classe em homenagem ao jornalista João Batista Líbero Badaró, morto por inimigos políticos em São Paulo, em 1830.
Para homenagear a categoria, a reportagem do Folha Regional entrevistou nesta semana, o jornalista Paulo Mello, 67 anos, que conta com uma vasta experiência na área. Com mais de 40 anos de carreira, o jornalista já trabalhou no Estado de São Paulo, Folha de São Paulo, Shop News, como correspondente do La Nacion, em São Paulo, entre outros. Em Rondonópolis, Mello passou pelo jornal A Tribuna, assessoria da Prefeitura de Rondonópolis, Câmara Municipal e Sindicato Rural.
Na entrevista, Paulo relata histórias vivenciadas na época da Ditadura Militar, da fuga para o Chile e sobre os anos de carreira com o jornalismo.
1. Na profissão há quanto tempo?
Desde que eu me entendo por gente trabalhava como jornalista antes de me formar. Eu não tive outra profissão na minha vida a não ser jornalista, exceto por um breve período, que montei uma agência de viagens quando cheguei a Rondonópolis. Tenho no mínimo 40 anos, sou formado em São Paulo, na Fundação Cásper Líbero, em 1979.
2. Quais locais você já trabalhou?
Eu trabalhei Alexandre Neri no Estado de São Paulo, com Mino Carta na Folha de São Paulo, fui correspondente do La Nacione em São Paulo, integrei o grupo que criou o maior jornal comercial que é o Shop News. Fui um dos caras que montou a assessoria de imprensa da Prefeitura de Rondonópolis no final de 1983, no mandato do então prefeito Carlos Bezerra, trabalhei no jornal A Tribuna em 1984, fui trabalhei na imprensa da Câmara, depois fui correspondente de revistas nacionais A Granja, Agrinova e DBO. Depois fui novamente secretário de imprensa por mais quatro anos e em 1992 assumi a assessoria no Sindicato Rural de Rondonópolis.
3. Tem alguma história que marcou a sua carreira?
Uma vez, o Alexandre Neri, você vai à Praça Clóvis em São Paulo, na central do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), quero que faça uma reportagem sobre a forma como as coisas andam lá, dificilmente vai para a primeira página, provavelmente deve ficar escondida em uma página interna, mas se a censura vacilar, a gente coloca. Cheguei ao local encontrei um delegado, era um dos maiores ferrabrás que me mostrou o local, ele era um desatinado tão grande que me levou aos porões, após ter ouvido uns gritos. Lá encontramos uma menina em um “pau de arara” e eu comecei a chorar, o coronel vendo minha reação disse que eu não servia para ser jornalista, que eu tinha que ser forte, ter ‘culhão’ e alertou sobre o que ia escrever. Subi as escadas o mais rápido, no jornal entreguei a matéria para o Alexandre e disse que sabia que não ia ser publicada. Olhei e disse “eu estou deixando o jornalismo para ser qualquer coisa na minha vida”. Mais tarde ele mandou me buscar e me explicou que havia me enviado até a central para entender que jornalismo é uma das profissões mais sagradas que existe, para ser jornalista antes de qualquer coisa tem que ser corajoso e ser sensível, tem que saber realmente onde está à alma das coisas e foi o que você fez hoje. Ele me disse uma das frases que norteou toda a minha vida: “A imprensa é a consciência crítica da sociedade”.
4. Como foi trabalhar na época da Ditadura Militar?
Foi o período de maior aprendizagem, quem foi jornalista em São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro naquela época precisava ter muita coragem porque estava sujeito a qualquer momento de ser preso e torturado. Um dos ícones do jornalismo brasileiro, Vladimir Herzog, foi morto a pauladas dentro da tutória, então era para ter medo. Aquele medo visceral das forças de repreensão é que nos fez crescer a ponto de nos tornarmos uma das imprensas mais importantes do mundo, um jornalismo independente e corajoso. A imprensa tem muito a ver com aquele período, naquelas agrumas da Ditadura que se formou uma geração que ensinou praticamente todo mundo que trabalha com imprensa, a ser jornalista e a encarar o jornalismo com responsabilidade. A imprensa em minha opinião é uma das mais independentes e éticas do mundo.

5. Você acha que o jornalismo mudou muito durante a sua profissão?
Não, eu acho que a imprensa continua sendo, especialmente no Brasil, a consciência critica da sociedade, como disse Alexandre Neri, e tem plena convicção disso e claro que em toda profissão tem exceções. Mas em sua grande maioria, a imprensa de hoje é livre, decente e ética consequência do período militar, a capa do Estado de são Paulo em determinada ocasião tinha sido praticamente toda censurada e nós colocamos uma receita de bolo.
6. Qual a maior dificuldade da carreira?
O jornalista não é um empreendedor, nascemos para ter salário, conforto, temos um status privilegiado na sociedade, mas na verdade, você não encontra em grande quantidade jornalistas ricos, a não ser que ele decida por juntar o empreendedorismo com a profissão, se montar, por exemplo, um jornal. Mas continuar jornalista a vida inteira como é o meu caso, não será rico. A maior dificuldade de toda uma geração é saber que ganhar dinheiro com uma profissão que não era para ganhar dinheiro e viver bem, mas quando você termina uma grande reportagem de capa, por exemplo, de uma revista nacional que será lido por milhões de pessoas tem um efeito purificador digamos assim, sabe que a sua verdade e a o enfoque que deu para determinado assunto será lido e discutido, isso engradece o ser humano.
7. Alguma curiosidade na sua carreira?
Quando eu sai do Brasil, eu já trabalhava no Malho, a coisa mais impactante da minha vida foi ter fugido do meu país para o Chile para não morrer. Eu fazia o Malho, um jornal feito pelo Largo de São Francisco, faculdade de Direito da USP, uma das edições foi sumariamente suspensa pela Polícia Federal, o DOPS e nós tínhamos as chapas resolvemos fazer uma edição pirata, os 12 integrantes do Malho compuseram uma lista que seriam presos. Oito ficaram e quatro conseguiriam sair fora, eu sai do mercado de São Paulo, em uma carga de colchões que ia para o Chile, eu atravessei a fronteira do Brasil deitado no meio dos colchões, era uma coisa dolorosa, suspense de morte, eu sai sem ‘lenço, documento e com a roupa do corpo’.
8. Qual a sua opinião sobre mídias sociais?
São importantíssimas, o que não concordo são com as frases feitas de que a imprensa tradicional vai para o brejo com as mídias sociais porque qualquer um poderá ser jornalista. A imprensa antes de qualquer coisa tem credibilidade, foi criada da maneira mais dura, com perdas. Nós criamos uma imprensa deitados em cama de faquir, a duras penas, a mídia social é um complemento dela. Serve mais comentar as notícias dadas pela imprensa, do que a imprensa servindo de suporte para mídia social. Uma não interfere na outra, as redes sociais tem a agilidade e a outra tem a credibilidade.
9. Você é contra ou a favor da exigência do diploma de jornalista?
Grandes jornalistas brasileiros, homens de textos brilhantes, que trataram o jornalismo como coisa séria não eram formados em jornalismo. Por exemplo, Assis Chateaubriand não era jornalista era advogado, Nelson Rodrigues era jornalista e não tinha diploma, Mino Carta não era jornalista também, se nós tivéssemos a maluquice para ser jornalista precisa obrigatoriamente precisa passar pela escola não teríamos esses nomes no jornalismo. Tanto eu acho que o jornalista nasce jornalista, tem que ter dentro dele a chama da notícia a chama da notícia, a alma do acontecimento, tem que ter decência para que ele não ter que ter opinião, que a isenção que o jornalista obrigatoriamente tem que ter nasce com ele. Claro que eu adoro a ideia de todos terem um diploma, agora proibir o cara de exercer o jornalismo se ele tem o dom, não tem como fazer isso.

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