Diabetes avança de forma silenciosa entre jovens

Doença crônica de maior impacto no sistema de saúde brasileiro devido a complicações como cegueira, amputações de membros e problemas renais, a diabetes atinge 6,5 milhões de pessoas no país — número de diagnosticados. O balanço não leva em conta um grupo submerso, ou seja, que desconhece ser diabético. Segundo estimativa do Ministério da Saúde (MS), em média 30% das pessoas acima de 18 anos estão com a taxa de açúcar no sangue alterada — com risco de desenvolver a doença — e não sabem.

Quando descobriu que era diabético, há oito anos, o comerciante Baltazar Costa Bandeira, 52 anos, jurava ter uma saúde de ferro. “Passei mal, fui ao médico. Depois do susto, tirei a cerveja da minha vida, além de trocar biscoito, bolo e pão por frutas e legumes”, ensina. Desde então, o comerciante consegue manter estável o nível de açúcar no sangue apenas com o controle da alimentação e a prática de exercícios físicos. Bandeira conta com uma grande vantagem no combate à doença: é proprietário de um mercado de hortaliças e frutas na Estrutural, o que acaba lhe proporcionando acesso fácil à alimentação saudável. “Ajuda muito”, admite.

De acordo com o endocrinologista Freddy Eliachewitz, chefe de endocrinologia do Hospital Heliópolis, em São Paulo, a alimentação adequada é importante, mas, sozinha, segura a diabetes por no máximo dois anos. “Ele (Bandeira) é um caso à parte. Representa 3% dos diabéticos”, diz. Na tentativa de ampliar a consciência da população, a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), em parceria com a Associação de Diabetes Juvenil (ADJ), começou a promover neste ano a qualificação de profissionais de saúde para atividades de educação em diabetes. A turma piloto da primeira capacitação da SBD envolveu 60 pessoas e terminou no mês passado. A próxima turma, ainda sem data marcada, está prevista para ocorrer no Rio de Janeiro.

O projeto Educando Educadores quer alcançar metas simples, como ensinar aos agentes de saúde a lidar com fitas para controle da glicemia, tanto no atendimento ambulatorial quanto no repasse de orientações aos pacientes que fazem controle da doença em casa. De acordo com o médico Augusto Pimazoni Netto, especialista na área de educação em saúde, diabetes é a segunda doença no mundo mais temida pelos pacientes. Só perde para a Aids. “Mesmo assim, as pessoas não se preocupam em adotar hábitos de vida saudáveis”, destaca. “O país precisa investir imediatamente no combate à diabetes para não gastar muito mais em 15 anos, com a quantidade de pacientes que devem apresentar problemas em decorrência de complicações com a doença.”

Há dois anos o Congresso aprovou uma lei para o tratamento do diabético, garantindo medicamentos, fitas e seringas. As diretrizes de dispensação de insumos e medicamentos para diabéticos foram regulamentadas no ano passado, mas o paciente que quiser ter acesso ao benefício precisa fazer o controle regular da doença, além de aprender a usar o material de que fará uso em casa.

Avanço entre os índios
A diabetes ameaça ser o “mal do século” para os xavantes de Mato Grosso. Um trabalho preliminar da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) nas comunidades de Sangradouro e São Marcos, realizado em 2007 e divulgado este ano, detectou que a doença tem incidência 15% maior nos indígenas da etnia do que na população em geral. Suspeita-se que, além da mudança de hábitos alimentares e do sedentarismo, a etnia tenha algum tipo de predisposição genética para o problema.

Desde os primeiros casos, registrados há oito anos, a diabetes vem atingindo principalmente a população entre 20 e 30 anos. Além disso, esse segmento tem apresentado elevada taxa de glicemia e baixa resposta à medicação oral, mesmo com o rígido controle do índice de açúcar no sangue. “Essas mesmas características já foram observadas no grupo Pima do Arizona, nos Estados Unidos. Lá, 40% da população adulta tem diabetes”, observa o médico Laércio Franco, da Faculdade de Medicina Social de Ribeirão Preto (FMRP-USP).

Também coordenador da pesquisa, o endocrinologista da Unifesp João Paulo Botelho explica que o estudo tem apontado o uso diário da insulina para o controle glicêmico como a melhor resposta para o tratamento do diabetes nos xavantes. “Isso sugere que exista alguma característica específica do tipo de diabetes que ocorre nessa população, pois só mudança de hábitos alimentares, exercícios e medicação não tem resolvido”, afirma Botelho.

Laércio lembra que, em Sangradouro, 70% dos diabéticos têm de usar insulina aplicada, procedimento considerado complexo para os índios, na avaliação do pesquisador. “Imagina uma pessoa que vive na aldeia aplicando injeção todo dia no próprio corpo”, observa. Muitos dos indígenas diabéticos acompanhados apresentam seqüelas típicas de quem tem idade avançada. “Tem índio que sofreu amputação de membros inferiores e apresenta tendência à cegueira”, exemplifica.

No estudo piloto, foram analisados 382 índios, de uma população de 1.549 habitantes acima de 20 anos de idade. Entre os diagnosticados, descobriram-se 47 portadores de diabetes tipo 2 (que pode ser genética e adquirida durante a vida), sendo 18 homens e 29 mulheres. Também foram detectados outros casos com a realização de testes de glicemia em indivíduos que apresentavam sintomas do mal, além de excesso de peso.

Laércio acredita que o acesso a produtos industrializados tem aumentado os riscos. Este ano, a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) prevê a distribuição de 23.813 cestas básicas para a população indígena — duas mil para os xavantes. “A composição dos alimentos é a mesma para a população em geral, mas nas regiões Norte e Nordeste a farinha de trigo será substituída pela farinha de mandioca”, explica o coodenador-geral de Atenção à Saúde Indígena do órgão, Flávio Nunes
Portal do Mato Grosso

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