Não bastou o assassinato do juiz Leopoldino Marques do Amaral, fato ocorrido entre os dias 5 e 6 de setembro de 1999, (o corpo do magistrado foi encontrado carbonizado em estágio de decopomposição e com perfurações de balas – dois tiros à queima-roupa, sendo um na nuca e outro no ouvido – na cidade de Concepción, no Paraguai, próximo à divisa com o Brasil, no dia 7 de setembro daquele ano), para que uma página de corrupção fosse virada no Tribunal de Justiça de Mato Grosso virada.
Contudo, a decisão unânime do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tomada corajosamente por 13 conselheiros, presentes à histórica sessão da manhã do dia 23 de fevereiro, em afastar 10 magistrados do Poder Judiciário mato-grossense, acusados de desvio ético, de contudo, tráfico de influência, pagamento indevido de benefícios etc, virou uma página de um longo histórico de corrupção no TJMT, conforme divulgou o Olhar Direto, em primeira mão, para todo o país.
Vale destacar aqui, todavia, o peso simbólico imensurável da decisão, do gesto de coragem, da sensibilidade dos conselheiros do CNJ. Prevalece a força do verbo, de cada voto proferido sobre defesas frágeis e inconsistentes. Prevalece a força da denúncia e da robustez das provas sobre uma retórica débil e vazia. Prevalem as palavras sobre as balas assassinas.
O "fatasma" de Leopoldino volta a assombrar os corredores do Tribunal de Justiça e, infelizmente, muitos pagam um preço demasiadamente caro pelos "gestos" impensados, imaturos, criminosos, audaciosos e corruptos de alguns poucos que mancharam e os que ainda mancham a imagem do Judiciário
Infelizmente, alguns "poucos" da década de 90 ganharam fôlego com a impunidade e com a falta de controle do Poder Judiciário e o grupo cresceu, para o desespero de uma geração desamparada, de sociedade desemparada e, como muitos afirmaram à época, para infortúnio do próprio Tribunal de Justiça de Mato Grosso.
Em 1999, o Judiciário de Mato Grosso fora destaque nacional justamente por conta da morte do juiz Leopoldino, então com 55 anos e titular da 2ª Vara de Família e Sucessões de Cuiabá, seqüestrado e levado para o Paraguai, onde foi execução ocorreu. Desesperado e acossado por denúncias de desvio de recursos dos depósitos judiciais na Vara da Família, Marques do Amaral decidira denunciar seus acusadores por crimes como tráfico de influência, corrupção, venda de sentença, desvio ético, desvio de conduta, fortes indícios de assédio sexual, nepotismo, fraudes em concurso público e (Ufa!) aposentadorias irregulares.
E, pouco antes de morrer, o juiz também anunciara, publicamente, que iria denunciar um novo e explosivo fato: o possível envolvimento de magistrados com o tráfico internacional de drogas. Indícios não faltavam para essa denúncia, também à época (como nomes de magistrados em planos de voo de um traficante internacional de droga, explosão de uma barcaça com cocaína em Cáceres de forma misteriosa etc). Leopoldino levou suas denúncias à CPI do Senado, instalada para apurar atos de corrupção no Poder Judiciário, e à Procuradoria Geral da República. Neste caso, o "gesto" pouco adiantou.
O articulista Salim Schead dos Santos assim reportou o caso à época: "O assassinato do juiz Leopoldino Marques do Amaral…deixou perplexo os brasileiros. Afinal, o magistrado ganhara notoriedade por denunciar alguns de seus colegas perante a CPI do Judiciário que se desenrola perante o Senado. Era jurado de morte. Seguranças zelavam por sua vida, e uma falha que provavelmente será objeto de investigação policial acabou por ceifá-la".
O 'gesto' do acossado e denunciado Leopoldino e as denúncias dos articulistas e dos jornalistas de nada adiantaram, até porque houve um certo açodamento, as tradicionais pressões de bastidores, leniência, complacência etc nas investigações, muito embora um lobista (Josino Guimarães) tenha sido preso, por 'gesto' de coragem do jovem procurador da República: José Pedro Taques.
Foi pouco diante do muito. Senão vejamos, Este site, corajosamente, denunciou pelo menos três casos de fraudes em concursos públicos realizados pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Todo cidadão consciente e qualquer humilde andarilho não alienado sabia que fraudes foram perpetradas, mas a "Justiça cega" preferiu enxergar crimes nas denúncias e não nas fraudes, imputando uma condenação ao editor deste sítio noticioso, em primeira instância, numa decisão polêmica de uma magistrada fortemente pressionada.
Afinal de contas, em jogo, estava, novamente, a "credibilidade" do TJMT. Filhos e parentes de magistrados (alguns até então nunca suspeitos de nenhum gesto ilícito) passaram num controverso concurso de juízes. O Olhar Direto denunciou, o Ministério Público Estadual (MPE) denunicou, mas nada adiantou. Todavia, é bom ressaltar, dezenas de advogados que acompanharam o início dos trabalhos dos juízes "aprovados" nos concursos fraudados podem testemunhar o despreparo destes magistrados, conduzidos pelos próprios pais e parentes em cargos para os quais não estavam devidamente preparados.
Mais uma vez, o 'gesto' e a denúncia de nada adiantaram. Prevaleceu, infelizmente, a vontade de uns poucos a manchar, a macular, novamente, a imagem do Poder Judiciário de Mato Grosso. Bajuladores de plantão e advogados asseclas comemoraram a prevalência da insensatez sobre as gravíssimas denúncias. Sem um CNJ e um controle externo ativo, o 'gesto' do Olhar foi desprezado e a inversão de valores prevaleceu, com uma condenação injusta, assim como em outros dois casos.
De nada vale citar nomes hoje (a não ser que o CNJ tenha a devida coragem de apurar, de fato, as irregularidades nos concursos) porque a "prescrição", assim como a tal imunidade parlamentar são mecanismos legais que evitam, infelizmente, que atos sujos e/ou suspeitos do passado sejam páginas viradas destes folhetins. Mas o "gesto" dos atuais conselheiros do CNJ, como já dissemos, é simbólico, pedagógico e, quiça, profilático.
Basta de impunidade! Basta de varrer a sujeira pra debaixo do tapete. Basta, porque novas denúncias pupulam no âmbito do Poder Judiciário mato-grossense, incluindo a Justiça Eleitoral, muito ou quão graves como as fraudes nos concursos. De nada mandar recados enviezados ou ameaças, porque, no final, o verbo e a palavram sobreviverão. Assim é o tempo, assim é a história, com todos os viéses e variáveis e "gestos" positivos e/ou negativos, nobre e/ou espúrios.
Fonte: Olhar Direto