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domingo, novembro 24, 2024

Dá para limpar o caminho

A cultura da papelada é o maior obstáculo para o plano do governo de construir 1 milhão de casas. Mas é possível fazer uma faxina na burocracia nessa e em outras áreas da economia
Problema
As construtoras levam até seis meses para obter financiamento dos projetos no sistema bancário. Na Caixa Econômica Federal, por exemplo, precisam cumprir pelo menos 54 exigências burocráticas para ter acesso ao dinheiro
Solução
Diminuir o número de exigências feitas às empresas para cerca de uma dezena, eliminando as redundâncias hoje existentes. A aprovação do crédito poderia sair em um mês
"Imaginávamos que fosse possível construir 1 milhão de moradias em dois anos, mas não tem limite, não tem data. Gostaria que terminasse em 2009. Sei que não dá. Se não der em 2010, que vá para 2011." A declaração, feita pelo presidente Lula ao apresentar no final de março um pacote para a construção de moradias populares, vale como uma confissão de culpa: dá a medida da morosidade que emperra o setor e da incapacidade do governo de solucioná-la. Da compra do terreno à obtenção da permissão para ocupar o imóvel pronto, o construtor tem de cumprir uma via-crúcis que requer dezenas de documentos. Um exemplo é o processo de financiamento da Caixa Econômica Federal, maior fonte de recursos para habitação no país. Recentemente, a presidente da Caixa, Maria Fernanda Coelho, afirmou que o banco havia eliminado 200 exigências normativas feitas às construtoras que pedem crédito. Ela admitiu, no entanto, que ainda restam 54 requisitos.
O pior é que a Caixa ainda não informou quais exigências foram eliminadas e quais perduram. Construtores ouvidos por EXAME dizem que conseguir o dinheiro no banco leva até seis meses. Para atravessar o cipoal da obtenção de financiamento, os incorporadores são obrigados a mostrar, em papel, nada menos que 12 certidões negativas. Algumas, como a da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e a negativa de débito do INSS, poderiam ser unificadas. Já a certidão de histórico, que prova a posse legítima do terreno nos últimos 20 anos e que chega a levar semanas para ser expedida pelos cartórios de registro, poderia ser emitida pela internet, a exemplo do que já ocorre com outras certidões da Receita Federal e das Justiças criminal e eleitoral. Estima-se que o número de exigências poderia cair para cerca de uma dezena.
O processo todo, além de muitos requisitos, tem redundâncias. Um bom exemplo do que deveria ser eliminado pela Caixa são as licenças ambientais – elas já são requeridas pelas prefeituras de cada cidade que abriga um projeto. "O pacote do governo está na direção certa, mas para ser bem-sucedido terá de vencer o enorme desafio da inércia administrativa", diz Paulo Safady Simão, presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção. Segundo o ranking do Banco Mundial que avalia o ambiente de negócios em 181 países, no quesito licenciamento de edificações, o Brasil caiu da 105a pior colocação no ano passado para a 108a agora. A etapa mais demorada de todas é tirar o alvará de construção: a cargo das prefeituras, consome pelo menos nove meses de espera. Nesse âmbito, faltam fiscais para fazer averiguações e apressar a liberação. Outra mudança importante, essa mais difícil de realizar porque é de ordem constitucional, seria a criação de um código nacional de obras.
Hoje, cada município tem seu código, com especificações diversas para pé-direito, tamanho de portas e janelas etc. A padronização desbastaria boa parte da burocracia e ainda tornaria a atividade mais eficiente, com ganhos de escala na indústria de materiais e na própria construção. O ataque à burocracia na construção traria vantagens não apenas de prazo mas também de custo. A Câmara Brasileira da Indústria da Construção estima que a burocracia aumente o custo final da obra em até 10%.
Ângela Pimenta / revista Exame

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