Crime fiscal e STF

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O Supremo Tribunal Federal deve decidir ainda neste ano se deixar de recolher o ICMS devido por operações próprias é crime, mesmo que o imposto tenha sido corretamente escriturado e declarado ao Fisco.

Isso quer dizer o seguinte: para o entendimento de parte do Poder Judiciário, se o contribuinte declara que deve o ICMS mas não tem recurso para pagar em um determinado período, é considerado crime contra a ordem tributária.

De acordo com tal entendimento, parte-se de uma premissa básica, qual seja, de que o empresário embute o valor do ICMS no preço do produto.

Por sua vez, o consumidor paga esse valor para que o vendedor o repasse ao Estado.

Ao deixar de fazê-lo, segundo tal entendimento, o comerciante se apropria indevidamente do imposto, não se tratando de simples inadimplência tributária, mas de algo muito mais grave, a justificar a pena de detenção de 6 meses a 2 anos.

Contudo, a lei não prevê essa conduta como crime. De fato, a lei recrimina o fato do contribuinte deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo descontado ou cobrado de terceiros, à exemplo quando o empregador desconta o imposto do salário do empregado e deixa de repassar à União.

Por essas e outras, se o não pagamento do ICMS próprio vier acompanhado de fraude, sonegação, dissimulação ou omissão dolosa de obrigações acessórias, haverá crime.

Ao contrário, se o contribuinte reconhece a dívida às claras, mas deixa de pagá-la, há apenas inadimplência. Nesse caso, por mais importante que seja a arrecadação tributária para a consecução dos mais aclamados fins, o instrumento para forçar o contribuinte é a cobrança judicial, sem adentrar no campo criminal.

Recorrer à prisão por dívida de tributos, transformando o Direito Penal em instrumento de política fiscal, é prática vedada pela Constituição e por diversos tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, caso da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

De todo exposto, aguarda-se que o Supremo Tribunal Federal analise a questão de forma definitiva, a fim de que separe o joio do trigo, não permitindo que a simples inadimplência tributária não resultante de qualquer ato fraudulento, venha a custar na própria liberdade do contribuinte.

VICTOR HUMBERTO MAIZMAN é advogado e consultor jurídico tributário.