O tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) deste ano, que tratou dos desafios para a formação educacional de surdos no Brasil, surpreendeu muitos professores e candidatos por abordar uma questão tão específica. Mas para cerca de 6 mil alunos com surdez ou deficiência auditiva que fizeram a prova, o assunto foi uma oportunidade para debater os problemas vividos no dia a dia.
A estudante Gleice Genaro diz que não consegue descrever a emoção que sentiu ao ver o tema da redação do Enem. Ela é surda congênita e estudou em escolas de surdos até o ensino fundamental. “No ensino médio, comecei a estudar em uma escola pública onde não tinha a acessibilidade, mas meus amigos me ajudavam muito. Hoje também já enfrento as barreiras na faculdade. Eu não tenho a acessibilidade e, além disso, faltam intérpretes de Libras [Língua Brasileira de Sinais] nas aulas”, conta.
Esta foi a segunda vez que a estudante fez o Enem. Ela já ingressou na faculdade de direito, mas quis prestar o exame neste ano novamente para experimentar o novo recurso da videoprova traduzida em Libras, oferecido pela primeira vez em 2017.
O recurso é importante porque muitos surdos e deficientes auditivos têm a Libras como primeira língua e o português como segunda, o que dificulta o entendimento da prova no formato tradicional.
Para Gleice, a possibilidade de fazer o Enem com a videoprova em Libras significa uma experiência única e histórica. “Foi a melhor prova de minha vida, afinal foi a única que fiz em vídeo em Libras, uma verdadeira inclusão”, descreve. Ela já tinha feito a prova com intérpretes de Libras, mas sentiu dificuldade. “Apesar de eu ser bilíngue, não chego ao mesmo nível de pessoas que têm a Língua Portuguesa como majoritária”, diz.
O Enem deste ano teve 1.925 solicitações de atendimento especializado para surdez e 4.390 para deficiência auditiva.
Reconhecimento
Aymee Lucy Silva, de 27 anos, também diz que ficou muito feliz com o tema da redação. “Já é hora de reconhecimento. Sou surda, tenho família surda também”. Ela fez o Enem pela segunda vez e quer cursar psicologia.
A estudante acha que o tema desagradou muitos candidatos por desconhecimento sobre o assunto. “O tema abalou o geral, mas é preciso acabar o preconceito com a pessoa surda e a pessoa com deficiência. Os participantes do Enem se chocaram com o tema”, afirma.