Um novo sistema partidário?

Rogério Schimitt (*)
Dediquei a maior parte da minha carreira acadêmica ao estudo do papel dos partidos no nosso sistema político. Depois que passei a trabalhar com consultoria no setor privado, continuei analisando (ainda mais de perto) a consolidação do sistema partidário brasileiro. Sem falsa modéstia, posso dizer que entendo bem desse assunto. Por isso, não resisti à tentação e resolvi revisitar a questão partidária na atual conjuntura.
Desde o fim das eleições presidenciais, venho acompanhando com bastante interesse as notícias sobre o que seria uma iminente e generalizada reorganização dos nossos partidos políticos. Se todos esses relatos fossem verdadeiros, não sobraria pedra sobre pedra.
O PT poderia incorporar os seus aliados tradicionais (PSB, PDT e PCdoB). Os partidos de oposição (PSDB, DEM e PPS) poderiam se fundir numa única sigla. O PMDB lideraria um "blocão" com outros partidos centristas (PTB, PP, PR e PSC). Alguns chegam até a mencionar uma possível incorporação do DEM ao PMDB. E como poderia me esquecer do emergente bloco parlamentar dos "nanicos" (PRTB, PRP, PTC e PSL)?
Já tenho tempo suficiente de janela para saber que essas notícias sobre fusões e incorporações de partidos são blefes típicos do período que vai da eleição presidencial até a posse do novo governo. Ao longo dessas semanas, o que as legendas estão realmente buscando é aumentar o seu cacife político, seja para participar do governo (no primeiro ou no segundo escalões), seja para influenciar a composição das comissões do Congresso na legislatura seguinte. Na melhor das hipóteses, as supostas fusões acabam se convertendo em meros blocos parlamentares. É como se a montanha parisse um rato.
Portanto, sou extremamente cético em relação à viabilidade do surgimento de um novo sistema partidário – composto por menos partidos e/ou por partidos programaticamente mais homogêneos. Essa não foi a primeira, e certamente não será a última vez, em que o tema frequentará as manchetes dos jornais.
Por outro lado, apesar de todo o meu racionalismo, devo confessar que, desta vez, me permiti usar um pouco mais a minha imaginação. Decidi levar a sério uma hipótese: e se todas essas fusões partidárias acontecessem de verdade? Em outras palavras, quais seriam as suas consequências práticas?
Ao explorar mentalmente essa "realidade alternativa", consegui visualizar a formação de um sistema partidário totalmente novo – composto por duas grandes frentes partidárias. Seria uma espécie de bipartidarismo informal. No campo da centro-esquerda, um bloco liderado pelo PT – ao qual se agregariam os seus aliados tradicionais e mais alguns convidados (PV? PPS?). No campo da centro-direita, um bloco liderado pelo PMDB – e reforçado pelas outras siglas do suposto "blocão" e pelo DEM.
E não é que a coisa até parece fazer algum sentido, inclusive do ponto de vista ideológico? De fato, esses são os dois blocos que darão sustentação ao governo Dilma. E ambos teriam força política suficiente para apresentar candidatos competitivos na eleição presidencial de 2014.
O único problema desse "mundo paralelo" seria em qual dos blocos encaixar o PSDB. Na minha imaginação, tive mais facilidade para enxergar os tucanos caminhando para o lado do bloco petista (de centro-esquerda) do que para o bloco peemedebista (de centro-direita). As lideranças dos dois partidos – ambas surgidas na oposição de esquerda ao regime militar – estariam enfim reunificadas.
Será que exagerei na minha "viagem"? Acho melhor voltar correndo para o meu ceticismo original!
* Consultor político e articulistado Congresso em Foco
Fonte: CVongresso em foco