Bolsonaro, o coringa brasileiro

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A primeira “pessoa” que pode surgir na cabeça daqueles que acabaram de assistir, ainda que seja tão somente o trailer do filme Coringa (Joker, no original) é do presidente Jair Messias Bolsonaro (PSL). Qualquer cidadão que consiga racionalizar os fatos políticos deste atual mandato e já tenha assistido algum filme ou desenho sobre o palhaço sinistro conseguirá realizar também essa comparação – de ambos estereótipos, seja pelo viés psicológico, emocional e até mesmo físico.

As semelhanças mentais são gritantes.

As analogias entre o personagem do coringa e do excêntrico mito não são apenas no tocante a falta de empatia, mas do sarcasmo habitual que se pode notar em seus discursos e comportamentos antissociais. Para o leitor chegar a essa conclusão, basta analisar as falas e as posições políticas do mito nesses últimos meses. Após 8 meses de mandato, representado pela figura de um político antiquado, ultraconservador e hostil aos valores da democracia, a impressão é que Bolsonaro perdeu as características minimamente humanas, para vestir o terno colorido da insanidade do coringa brasileiro.

Assim, utilizando-se das facetas dissimuladas de um palhaço irônico e trágico, o mitomaníaco vem adotando uma postura dúbia ao pregar o moralismo ético “interna corporis” para administração pública do Governo Federal, ou seja, para todos que estão sob seu controle draconiano, porém, ao mesmo tempo, fecha os olhos para os atos antirrepublicanos dos seus próprios filhos.

As intervenções políticas em órgãos federais, que tinham antes a autonomia jurídica necessária para investigar – como na Polícia Federal (PF), na mudança do antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), na superintendência da Receita Federal – deixam essa postura do presidente mais do que evidente.
Desta forma, ele levanta a espada da moralidade, ao pregar a legalidade máxima para limitar o comportamento de seus “súditos” e inimigos, mas se defende com o escudo da hipocrisia legalista, ao proteger os próprios filhos desmobilizando os aparatos de fiscalização e combate à corrupção; a fim de aliviar a fúria punitiva do Estado contra seus pupilos.

E mais, Bolsonaro atropela todas as recomendações constitucionais solenes do cargo da Presidência da República a fim de proteger os filhos e reservar a parte mais suculenta do “filé mignon” para eles, pois até a Embaixada dos EUA Bolsonaro ainda quer garantir ao deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL), ainda que ele notoriamente não tenha o conhecimento jurídico necessário para atuar em uma das carreiras mais complexas da diplomacia brasileira.

Com essa postura cínica – de palhaço dissimulado, insensível e ditador, que usa sua metralhadora verbal para disseminar mentiras; sem ao menos piscar os olhos ou ter uma alteração no sorriso sarcástico facial – ainda assim o mito tem milhões de seguidores, que, de tal modo, como ele, continuam fomentando pensamentos negativos de ódio, de individualismo, de falta de empatia e rancor.

Essa definição ficou mais clara quando os editores do site IndieWire (da indústria cinematográfica) escreveram sobre o perfil dos homens que seguem o coringa: “homens brancos solitários, criativamente impotentes que são atraídos por ideologias de ódio por causa das comunidades raivosas que se fomentam ao redor deles".
Isso porque, em nome da morte da social democracia e para se garantir um lucro exorbitante, ainda que seja de forma ilegal e nociva para o Meio Ambiente, mesmo que, para isso, uma boa parte da população tenha que ser excluída das políticas públicas, muitos aceitam e até brigam pela institucionalização do caos e desse tipo de barbárie política, pois querem garantir os próprios interesses em detrimento da sobrevivência sustentável e digna de toda uma coletividade.

No filme, o personagem do coringa legitima a selvageria e toca o terror na cidade. No entanto, quem garante que na realidade o discurso do ódio, da intolerância, da afronta às leis democráticas, não estimula atitudes incivilizadas, como a de praticar desmatamento ilegal e queimadas em áreas que deveriam ser preservadas pelo Estado?

Desde o início da campanha eleitoral que Bolsonaro vem legitimando a marginalização ambiental dos produtores brasileiros. Depois que assumiu o poder, então, nem se fala…Um esforço desnecessário, mas monumental do governo para desmobilizar os aparatos de fiscalização do IBAMA, para desacreditar o trabalho científico de um órgão federal, como o INPE, bem como os ataques indiscriminados às ONGs e por aí vai. Não é à toa que o Brasil estava em chamas.

Depois não querem perder o carimbo verde da preservação ambiental e sofrer boicotes por parte do mercado internacional. Será que o mundo inteiro está errado e somente Bolsonaro, com essa visão retrógrada – de produção insustentável e diplomacia bélica – está certo?

Mas voltando ao filme, Coringa mostra como o atrapalhado Arthur Fleck (Phoenix), aspirante a humorista, mas cuja carreira jamais decolou por problemas psicológicos, tornou-se o grande vilão Coringa, o terror da caótica metrópole Gotham City…. Coringa estreia mundialmente no dia 03 de outubro…. Fica a torcida para aqueles que assistirem ao filme tenham essa percepção política de não contribuir para o crescimento da serpente fascista.

Então, a crítica política implícita no filme servirá para trazer à tona esse espírito de indiferença pela dor do próximo, a denúncia ao avanço dos discursos fascistas diante da onda ultraconservadora de direita que vem crescendo pelo mundo afora.

Assim, da mesma forma com o coringa representa o palhaço incompreendido, amargurado, que vive cercado de conflitos e inimigos invisíveis para todos os lados, que visa pôr fim a todo caos urbano à força, libertando seus fantasmas da infância frustrada para isso; Bolsonaro também está desamparado de sentimentos humanos e dançando a valsa da guerrilha ditatorial, ou seja, atirando para todos os lados; com a intenção ilegítima de impor aos cidadãos brasileiros o seu pensamento extremista: de único homem de “bem” e dono exclusivo da “moral” no mundo.

MARCELO FERRAZ é jornalista e escritor.