Academia e a Extrema-Direita: Qual a Linha de Defesa?

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O Bolsonarismo tem nas universidades públicas seu inimigo preferido. No palanque do conservadorismo de extrema-direita, a academia é o foco de disseminação do modelo a ser destruído. O conhecimento acadêmico é o símbolo do status quo decadente: o iluminismo republicano. A "esquerda comunista" representa não somente uma escola de pensamento específico, como o marxismo. Mas tudo o que refuta a horizontalidade do "senso comum". As crenças errôneas disseminadas como "fake news", na verdade, são cânones que identificam os participantes do grupo. Verdadeiras insígnias que condecoram a luta ao modelo dominante.

Mudanças climáticas, pedagogia de Paulo Freire, keynesianismo econômico, entre muitas abordagens, são percebidas como orientações que organizam o "sistema de controle do Estado". O demérito imputado não é oriundo de um equívoco científico. Ou seja, uma razão epistêmica. Mas por serem entendidos como mecanismos de dominação de uma elite intelectual e burocrática de funcionários públicos. Esse grupo hegemônico vive, na visão da extrema-direita conservadora, de rendas usurpadas dos pequenos empreendedores, da classe média de profissionais liberais e dos ruralistas. Caracterizam-se como beneficiados, sem mérito, do custoso "peso do Estado".

Na visão revolucionária do Bolsonarismo, a classe acadêmica assemelha-se às ordens feudais de nobres e clérigos, afastada da sociedade e improdutiva. Consequentemente, o papel da universidade deve ser substituído pela interação direta, via o conhecimento "prático" e sem "ideologias", propagados nas mídias sociais, empresas e igrejas. O risco reside no extremo fundamentalista, que caracteriza as visões divergentes como desvalidas de humanidade; ou seja, portadoras de um desvalor intransponível. Numa comunidade de ungidos pela divindade, ou por um formador de opinião digital, não há possibilidade de exercício da divergência democrática. Isso ocorre no Brasil atualmente. Por exemplo, com o receio de muitos em demonstrarem sua inclinação política e sofrerem agressões verbais, ou mesmo físicas.

Neste cenário, em que a distopia veio para ficar, o que pode ser feito? Acredito que o único meio de se enfrentar essa ameaça da extrema-direita reside no engajamento social da academia. Abrir o que se percebe como uma "caixa preta". Primeiro, radicalizar-se no abandono de insígnias de status acadêmico, como títulos, cerimoniais e verborragia de citações. Falar a fala da sociedade, e despir-se de vaidades. Segundo, fortalecer o engajamento aos problemas da comunidade, não importam quais sejam. Mais importante do que alcançar indicadores de produtividade acadêmica – citações, publicações, premiações, taxas de sucesso, notas no Enade, ou conceitos da Capes – a universidade deve ser percebida como cidadã. Isso significa, no momento presente, contrariar interesses estabelecidos e o conformismo interno; portanto, requer coragem.